Se resolver usar meus textos para finalidades pessoais, por favor, tenha a delicadeza de citar a fonte.

Olhos desejosos de luz

Há algum tempo um desassossego, que pena desprovido de qualquer nuance do Desassossego poético de Bernardo Soares, instalou-se resoluto em mim.
O sinto ora no estomago, na forma de uma ânsia que parece querer expulsar qualquer coisa corpo afora. Ora migra para a garganta na forma de um grito ancestral libertador a contragosto contido. Percorre minha nuca e ombros, e quando chega às minhas mãos, as faz desejosas de ação.
A noite, quando me deito à espera do sono amigo, faz minhas pernas saltarem, como se se recusassem permanecer ali.
Mas é nos olhos que essa iminência de algo incerto ganha força. Olhos que desvelados vão ao ponto mesmo de arder com o que veem.
Um mundo que embora concreto quase me convence não ser real e minha razão questiona o olhar. É como se cada objeto escondesse outras verdades que meu ver não alcançava. Um algo mais que jamais se revelava porque me acostumei com o algo menos.
Uma ocultação que me faz duvidar se esse eu por quê vejo sou o eu que nasci para ser ou um eu outro que ocupei, um corpo que invadi.
Era seguro ver o mundo quando o que via era aceito por meu senso comum. Mas meus olhos se tornaram reflexivos, teimam agora enxergar, vão hoje além da informação visual pronta, imediata. Descobrem por si caminhos outros que embora me façam ansiar, se mostram difíceis de trilhar (mas meu coração nunca ligou para isso, as dificuldades sempre foram parte dos meus caminhos); desarmonizam-se com meus pensamentos acomodados e, magoados, se turvam sob uma lâmina de lágrimas.
Forçados à resignação, voltam-se então meus olhos para o chão e o grito ancestral se debate revolto em minha garganta dolorida. Não corro, por ora, tão pouco removo de pronto os obstáculos de diante de mim. Me recolho inquieto, mãos fechadas, braços cruzados, olhos cerrados, coração contido.
E o desassossego sem poesia se mostra, apenas para mim, com toda sua dolorosa angustia.
Não é bom de sentir, mas é legitimo e por isso é bom em sua essência; a força motriz que nos fez caminhar eretos para fora de nossas cavernas.

Aldo Masini

Queixume

Hoje amanheci sentindo o peso da pressa com que o tempo inexoravelmente se esvai.
Noto essa semi ardência constante nos olhos, parecem ter perdido o foco da paisagem.
As juntas ainda não doem, mas rangem um reclamar quase rabugento.
Os pensamentos são rápidos ao se lançarem a lembranças lentas.
O respirar é como um desabafo, um suspirar algo lamurioso, um choramingar do peito.
Na pele um arrepio, que não advém de frio, pois que esse não há, exceto em mim.
O coração enfim se manifesta, pulsa um bater modorrento como quem aplaude, contrariado,
o inicio de outro dia; exatamente igual a todos os demais dias e como os tenho vivido.
A vida lá fora segue seu ritmo de bossa nova, mas eu, recluso em mim, perdi o compasso.
O que não me impede de ver por uma janela opaca, o escoar ligeiro do tempo.
Meu corpo ainda não o diz claramente, mas estou envelhecendo, mais rápido que o próprio tempo.

Aldo Masini

Sem uma estória que valha a pena contar, minhas mãos jazem tristes

Será cansaço?
Vai tão além do físico.
Mas, poderia a alma também cansar-se?
Esse peso de tudo e em tudo
Que torna o respirar dolorido,
põe uma constante lâmina d’água no olhar,
distâncias intransponíveis em tudo que almejo
e a vontade de desistir é sempre mais convincente.
Sinto a tristeza em mim e nem ela me diz de onde vem
Mas vem, me toma pela mão como quem pede socorro
Ela também está perdida, cansada, sozinha.
Sorrisos alheios acenam alguma esperança
Mas ela própria não se convence, não se sustenta
Questiona a validade do dia e à noite será lembrança
Minhas mãos há tanto trêmulas e fracas
Repelem copo e caneta
companheiros de outras crises
Volto a elas o olhar molhado
Estão tristes também
Se sentem menores do que foram quando
o vigor em mim me permitia sonhar
Ambos se acabaram, vigor e sonhos
Não há mais trabalho para as mãos
Não restou-lhes o que construir, o que cavar
Pior, uma história que valha a pena contar não restou
Se foi a alma quem se cansou
Contrariando o que pensei, ser ela energia pura,
Tomara tenha também errado julgá-la eterna

Aldo Masini

Suspensão forçada das aulas na PUC

Pois é, hoje não terei aula; a PUC estará fechada por ato de seu magnifico Reitor. O motivo? O 1º Festival da Cultura Canábica na PUC-SP, promovido sem a chancela oficial da Universidade.
Sem me alongar em considerações, entendo que esteja TUDO, tudo errado.
O Reitor optou pelo mais fácil, passar a tranca nos portões e deixar todos de fora, especialmente quem vai à PUC para estudar; pondo assim todos na mesma vala, estudantes e festeiros. Do outro lado estão esses maconheiros bundas moles e desinformados que escolheram a PUC para seus “eventos culturais” unicamente por achar (erroneamente) que lá “a policia não entra” e então poderiam promover seu "festival cultural" sem tal preocupação.
Resumo da ópera (não no TUCA é claro, pois que o barulho da "pracinha" inviabiliza), quem se fode é a gente, que paga e tão tem aula.
Pergunto, não seria o mais correto que aqueles que apregoam a liberdade de manifestação procurassem outro lugar para exercitar sua liberdade em respeito à liberdade de quem opta por ir à universidade para estudar? De outro lado, não seria mais justo por para fora do espaço universitário unica e definitivamente quem dele se vale com objetivos que inviabilizam as práticas acadêmicas?
Como disse acima, está tudo errado.

Aldo Masini

Sinistra congregação

O Estado Democrático de Direito descrito constitucionalmente, depende do bicameralismo, isto é, Câmara dos Deputados, em tese defensora dos interesses do povo e Senado Federal, em tese defensor dos interesses dos estados membros.
Todavia, quando nos deparamos com situações absolutamente corporativistas como a demonstrada ontem com a absolvição da deputada Jaqueline Roriz onde claro ficou o comprometimento entre os pares e não o esperado compromisso com o Estado Democrático de Direito, avalio como pertinente a pergunta, para que precisamos de um Congresso que legitima o que é espúrio e ignora os interesses que pela Constituição deveriam honrar?

Congresso como o nosso só serve aos congressistas, ou melhor, aos seus congregados; definitivamente, não nos serve.

Aldo Masini

Daniel

Tá certo, “mea culpa” a estória de secar lágrimas em calcinhas, piada das que contamos nas portas dos boteco na PUC mas, diante tantos comentário (confesso que não imaginava tal repercussão), me vejo forçado a contar a história (essa com “h”) de um tal Daniel, um mendigo que andava pelas ruas do Butantã em minha meninice, acho que minhas irmãs também se lembram dele, especialmente a caçula, que tinha medo do sujeito.
Daniel era um negro franzino de origem nordestina que, embora metido em roupas surradas e sujas, fazia questão do paletó e eventualmente até uma gravata. Carregava um “embrulho” de jornais como cabedal (típico dos chamados modernamente “não semelhantes” – termo horroroso diga-se).
Daniel tinha um apreço diferenciado por mim, sabia disso porque em várias oportunidades em que me encontrava, fazia questão de apertar minha mão, me olhava nos olhos, retirava do meio dos jornais uma faca e dizia, “Aldo, sempre que precisar de mim para te defender, pode contar com minha faca, você é gente fina” – ato continuo, me mostrava seu simpático sorriso desprovido de dentes.
Daniel falava muito bem, era articulado com as palavras, gostava de ler e conhecia detalhadamente a estória do personagem Tarzan, tanto dos livros (inclusive os originais em língua inglesa, que lia com fluência) quanto dos filmes e, a exemplo de meu pai, tinha preferência por Johnny Weissmuller.
Daniel me contou sua história de vida (contou-a também, uma versão mais heroica, para uma revista da época). Havia sido metalúrgico, letrado, morado com dignidade; já tinha sido feliz. Muitas eram as especulações sobre o que o tinha levado à mendicância, à violência, à sombra que havia se tornado.
Todas fantasiosas ou exageradas, mas eu soube da verdadeira, a mim Daniel contou. Desiludiu-se com o amor de sua vida, uma mulher cujo nome ainda fazia seu olhar brilhar. Quando ela partiu de sua vida deixando-o só na casa que para ambos havia construído, não suportou a dor e a ela se entregou até não se reconhecer mais. Se fosse poeta, teria morrido alcoolizado ou tísico, mas como era caldeireiro e abstêmio, matou-se apenas para a si mesmo.


Aldo Masini

Alados namorados

Há dias venho observando um casal de bem-te-vis que resolveu nidificar no poste em frente à minha varanda (coisas de passarinhos urbanos, coitados).
Hoje eles me deram mais um presente enquanto acompanhava o despertar do dia.
Um deles, não sei qual, chegou primeiro ao poste, piou forte, mas sem alarido e ali ficou, paciente porém atento.
Outro piado se ouviu, vindo de lugar incerto aos meus ouvidos, mas não aos dele, ou dela, que se esticou e o respondeu.
Em seguida o par chegou e juntos piaram seus pios característicos batendo as asas e crispando as penas como um verdadeiro casal enamorado que comemora o fim da saudade. Em seguida voaram juntos em direção à praça onde começaram a recolher aquelas coisinhas de que se compõe os ninhos.
Fiquei ali observando o vôo dos dois e aquela musica que dizia “love is in the air” instantaneamente me veio à lembrança. Tal expressão nunca teve sentido tão concreto para mim antes.

Aldo Masini

No Dia do Beijo

Existem beijos de todos os tipos.
Fraternos, pueris, piedosos, enlouquecidos, dramáticos.
Existem inclusive os falsos, mas estes não porei na equação, não valem a pena.
Os apaixonados são especialíssimos.
Os de mãe também o são e para elas, as mães, os de seus filhos, mesmo que múltiplos, são únicos.
Molhados, quando trocados pelos pares que se tenham escolhido como tal, são mágicos.
Os franceses, ou de língua (como os prefiro definir) têm o poder de nos fazer transcender.
Como transcendentais são também aqueles que nos chegam depois de longa espera.
Os transmitidos por via indireta também têm valor de beijo dado para quem os envia.
Infelizmente porém, mesmo os tomado de sinceridade e afeto, nem sempre produzem o efeito esperado em que os receba, especialmente quanto mais indireta a via por quê veio o beijo. É como se a alma dele se tivesse perdido no caminho.
Daí a reflexão, beijo é tanto melhor quando oferecido e recebido presencialmente e, sendo hoje o Dia do Beijo, beije, e, se possível, te toda forma, todo tipo imaginável de beijo.
Beije e se deixe beijar.

Aldo Masini

Noite sem música, noite sem sonhos

Essa noite não sonhei
As habituais sabiás madrugadoras, que parecem ter formado um clube de boêmias na praça em frente minha janela, nessa madrugada estiveram silenciosas; me deixaram dormir a noite toda e, ao contrario das noites em que acordo com cantoria, nessa (e espero que só nessa), não sonhei
















Deve de ter, no canto das sabiás, alguma coisa que alimenta os sonhos

Aldo Masini

Às vezes

Às Vezes


Às vezes,
minhas palavras não são capazes de traduzir com clareza tudo em que penso,
aquilo que sinto
e menos ainda o quê me vai na alma...
Às vezes,
meus pensamentos correm rápidos demais e não consigo acompanhá-los,
meu coração bate rápido demais,
como se desejasse fugir de dentro de mim,
ganhar independência, vida própria.
Às vezes, é minha alma que deseja correr,
partir para longe,
longe desse coração que sente e se ressente,
longe desse corpo que envelhece e se condói,
longe desses tantos pensamentos conflitantes,
longe dessas palavras que se perdem em enganos grosseiros
longe de tudo que macule o amor puro e branco
que minha alma tem pela vida.

A. Masini


Um mundo novo por detrás das palpebras

Um mundo novo por detrás das palpebras


Te enxergo tão bem quando de olhos fechados
que quando os abro,
nos efemeros instantes que ainda dura o lume do seu sorriso,
um mundo novo se descortina diante minha retina.
Nele, tudo é mais vivo
tudo é mais iluminado
tudo é mais colorido.
E minha vida,
a que ainda restou dentro de mim
me diz que esse bocado de existência,
sensivel apenas por suspiros
ou lágrimas fugidias desses mesmos olhos quando ha mais tempo abertos,
pode valer a pena
se o piscar dos meus olhos for mais lento, mais freguente
porque só quando os fecho
consigo observar o que há dentro de mim,
no centro do que sou.
Lá, você ainda permanece a mesma,
que um dia por mim também se apaixonou.

A. Masini


Apartados (antes mesmo de unidos)

Aparados



De onde vem esse seu poder de transformar meus dias? De reunir cada uma das nuvens escuras de chuva e fazê-las dissipar, para em seguida, surgir o sol, iluminando cada canto escuro de minha alma atormentada?

De onde vem esse encanto, que me faz depositar cada uma das minhas esperanças nos sonhos que seus sorrisos me promovem?

De onde vem esse sentimento que me invade os olhos, corre por minhas veias, toma meu corpo e se instala em festa em meu coração a cada oportunidade que tenho de te ver?

Que coro angelical é esse que canta pra mim sempre que te ouço?

Que mulher é você, que parece ter sido feita sob medida para meus abraços, beijos e carinhos?

Que vida afinal é essa, que apesar dessas tantas coisas que me põem na sua direção, ainda assim nos manteve apartados de tudo isso?



A. Masini