Manhã de quinta-feira. O céu é azul e há um sol sereno clareando
o mundo quando chego à rua.
O senso comum me faz concluir, objetivamente, que o dia está
lindo. Mas, subjetivamente, o que pensar, melhor, o que sentir desse dia?Há uma certa apatia modorrenta pairando no ar.
Percebo.
O sol me toca morno a pele e me agrada. Me agrada também o som da passarinhada empoleirada nas árvores, árvores que também cantam com o vento que há.
Observo.
O passeio foi forrado de folhas caídas das árvores onde florescem orquídeas lá postas por mãos que não conheço.
Sigo.
Alguns carros passam rápido levando pessoas solitárias, apressadas por chegar cada qual ao seu destino. Um outro estaciona, do interior desce um menininho fantasiado de super-homem fazendo pose de herói, mas quando tentar correr para dentro da escola, a mãe de um grito mostra quem manda.
No radinho de pilha do porteiro toca “Namoradinha de um amigo meu”, que embora jovem para saber o que é isso, ouve a música com olhar distante sugerindo compreender do que ela fala. Ou talvez fosse apenas ressaca, como a minha.
Uma senhorinha idosa com ar sofrido jaz sentada na calçada observando o mesmo mundo com seus próprios olhos por traz de óculos velhos. Parece solitária, de uma solidão nascida há muito, mas que o mesmo tempo que lhe marcou o rosto, também conformou.
Pisado na calçada, quase irreconhecível, o filhote de passarinho caído d’algum ninho; morto, não ouve o canto dos parentes de melhor sorte como também não conhecerá o vento, sustentáculo de suas asas jamais abertas.
Na padaria a moça bonita de pernas à mostra, alheia ao resto do mundo, digita frenética seu gadget enquanto seu café certamente esfria. Não vejo seus olhos, estão ocultos por óculos escuros, mas sua boca, de lábios constritos, indica alguma aflição.
Um casal discute baixinho. Ele dedo em riste, ela, olhos molhados. O pão meio comido à mesa indica outro pedaço, possivelmente entalando a garganta da moça chorosa.
Passa por mim uma princesa com espirito de corredora. A mãe corre atrás. Os heróis são menos charmosos, mas muito mais divertidos; mais necessários até, nesses tempos de vilões cujas máscaras não ocultam o rosto, mas o mau caráter.
Pobres princesinhas, pobres crianças, pobres senhorinhas sofridas de rostos marcado pelo tempo.
Sigo.
Um avião ruidoso me faz olhar para o céu, há agora algumas nuvens esgarçadas como roupa velha, puída. Não indicam chuva, apenas enfeitam o azul com fiapos brancos.
Agora são duas as senhorinhas sentadas na calçada. Não falam entre si, apenas olham ao redor como que esperando que a vida lhes sorria. Uma delas me nota, nota também meu olhar e em lugar do sorriso que imaginei carecia, o oferece com dentes gastos, mas é honesto e carinhoso. Antes ainda é caridoso, sensível ao olhar que trago, agora baixo, envergonhado.
Sigo.
O sol morno continua a me agradar, assim como os sons das folhas e pássaros.
Trago ainda a mesma sensação de apatia, mas agora identificada, não pairante, mas subjetiva.
Todavia, mais do que o saco de pães, carrego também um sorriso caridoso de presente.
O dia está subjetivamente lindo.
A. Masini
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O aprendizado se dá por tentativa, erro e a correção do erro. No meu modo de ver, o erro é uma ferramenta de aprimoramento. Assim, te convido a deixar seu comentário. Abraço, Aldo