Criatividade
Estávamos conversando sobre qualquer coisa que agora me escapa à
lembrança, porém, à medida que concluir meu relato, sei que muitos entenderão o
motivo do esquecimento e como eu mesmo, perceberão tratar-se de questão de
menor importância.
- Não tio, o rosto do palhaço é pintado de branco. Não é cor da
pele.
Ante tal afirmação, incauto, pensei em provocá-la fazendo-a
pensar na pluralidade de matizes que a pele pode ter quando consideramos a
quantidade de pessoas e fatores que determinam tais cores.
- Cor da pele querida? Mas, que cor afinal é a cor da pele?
E, antes mesmo de fazer a carinha de interrogação que
ingenuamente imaginei que faria, a danadinha me respondeu.
- É o rosa “desligado”.
Não ví meu próprio rosto, não havia espelho ali, mas sei que
fiquei eu mesmo com a tal cara de interrogação, para não dizer cara de palerma.
- Rosa “desligado” amor? Que rosa é esse?
E ela então, com a desenvoltura de uma atleta olímpica e a graça
de uma bailarina atrapalhada correu dali sem dizer palavra para voltar em
seguida trazendo um lápis de cor já pela metade respondendo orgulhosa.
- É esse tio, esse rosinha.
Era rosa, rosado, rosinha; aquele rosa claro pastel opaco sem
graça apagado enfadonho. Cor da pele, por convenção dos coloristas, como se todos
nós tivéssemos cor de boneca.
- Querida, então é esse o rosa “desligado”?
- É esse tio. A “prô” disse para usar esse rosinha para pintar a
carinha das meninas e meninos que a gente desenha. Mas eu gosto mais de pintar
de azul ou de verde, quando desenho um menino palmeirense.
E mesmo correndo o risco de invadir uma seara que não é a minha,
me arrisquei a implicitamente contradizer a professora, a “prô”, como ela
disse.
- Querida, não há regras para pintar, você pode usar as cores
que achar bonitas. – mas como continuava curioso quanto à adjetivação atribuída
ao rosa cor da pele emendei. – Mas querida, por que rosa “desligado”?
- Porque o outro é rosa choque né tio.
Então me dei conta da beleza singela da criatividade infantil.
Uma beleza pura e sem tamanho que às vezes, infelizmente, tentamos limitar com
nossa imaginação “desligada”.
A. Masini
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O aprendizado se dá por tentativa, erro e a correção do erro. No meu modo de ver, o erro é uma ferramenta de aprimoramento. Assim, te convido a deixar seu comentário. Abraço, Aldo