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Um Cavaleiro que gostava de bananas

– Tia Lucia, agora eu vou morar aqui com a senhora?
– Vai sim querido, pelo menos até a vovó sair do hospital.
– A minha vó vai melhorar né tia?
– Eu espero que sim querido, mas, peça por ela nas suas orações.
– A vó me ensinou a oração do anjo da guarda. Essa serve tia?
– Serve sim querido.

Dizendo isso a tia abraçou o menino e ela própria fez um pedido a Deus por aquele garoto tão jovem e tão solitário. Lucia não era uma tia próxima; vivia na cidade e só tinha encontrado o filho de sua irmã ausente uma única vez quando em visita à casa de sua mãe agora enferma. Se não estivesse tão compadecida com a situação do sobrinho, oraria por si mesma, pois não tinha a menor ideia de como cuidaria daquele menininho de olhos assustados.

– Tia, eu posso dormir com a senhora essa noite?
– Pode sim querido. Assim faremos companhia um para o outro.
– Eu dormia sozinho na casa da vó, mas lá meu anjo da guarda me protegia.
– O seu anjo da guarda estará sempre onde você chamar por ele querido.
– Hoje não. Hoje eu pedi para ele ir cuidar da vó. Ele vai dormir no hospital com ela.
– Você é um menininho muito especial João. Agora vamos dormir porque o dia foi muito cansativo.
– Tia, posso tomar um Nescau e comer uma banana antes de dormir? Eu não gosto de dormir de estomago vazio. A vó disse que não faz bem.
– Claro querido, mas acho um pouco tarde para bananas. O que acha de Nescau com bolacha? É mais saudável.
– O que é saudável tia?
– É aquilo que faz bem para o seu corpo.
– Ah, entendi. Mas eu gosto tanto de banana.
– Tudo bem então anjo, pode comer uma banana. Você se lembrou de pegar sua escova de dentes?
– Ahã.

Dormiram abraçados naquela noite.

– Que cheiro bom é esse tia?
– Querido, descalço aqui na cozinha?
– É que acordei e não vi a senhora na cama, ai senti esse cheirinho de visita.
Risos – Não é visita querido, é café. Vai por uma roupa e se calça para a gente tomar café da manhã.
– Lá na vó eu ficava assim mesmo.
– Lá é mais quentinho, aqui faz frio. Além do mais, na cidade, os menininhos não costumam ficar só de cueca.
– Tá bom tia, já volto.
Ante a demora do menino a tia resolve checar e o encontra estático diante da janela da sala.
– João, algum problema querido?
– Tia, naquela casa ali da frente, tem uma menina de cabelo comprido tão bonita. Igual a princesa que a vó me mostrou no livro.
– Ah, é a Ester, filha da Verinha. Ela é uma fofa. Um pouco mimada, mas é mesmo lindinha.
– Ester? Nunca ouvi esse nome. Não é muito bonito. Posso “chamar ela” de Teté?
– A gente não diz “chamar ela” querido e sim, chama-la. Não sei se pode, mas, quando a encontrarmos, você pergunta se ela concorda.
– Nós vamos encontrar com ela?
– Depois do café da manhã, podemos ir até a casa dela para conhecê-la. O que acha?
O menino nem respondeu, saiu em disparada em direção ao quarto. Voltou ainda descalço, mas agora vestindo a calça do pijama e uma mantinha amarrada ao pescoço.
– O que é isso querido?
– Fui por minha roupa de “cavalero”.
– Cavaleiro querido.
– Cavaleiro?
– Sim, se você está pensando naqueles homens montados a cavalo é cavaleiro que se diz.
– Isso, com cavalo, espada e lança.
A tia sorriu da pose de herói do sobrinho com mãozinhas na cintura e antes que pudesse dizer qualquer outra coisa, o menino seguiu:
– Tia, eu não tenho cavalo, nem espada.
– Mas para quê você precisa de cavalo e espada para ir conhecer a “Teté”?
– Para “proteger ela” daquele homem de barba que fica na entrada da vila.
– Querido, você não precisa protege-la daquele homem, ele é o vigia da nossa vilinha. O nome dele é Jorge.
– Protegê-la. Jorge?
– Sim, como o São Jorge que tem no oratório da vovó. São Jorge era cavaleiro também sabia?
– Sério tia? Com cavalo e espada?
– Sim, cavalo, espada e lança.
- O homem de barba tembém?
- Não querido, o Sr. Jorge nosso vigia não tem espada mas está lá para nos proteger, não precisa ter medo dele. Ele é calado, mas é boa gente.
– Calado?
– Sim, fala pouco.
– Por que?
– Acho que prefere assim.
– Pra ser cavaleiro tem de ser calado tia? Acho que a princesa Teté não vai gostar de mim então.
– Eu acho que ela seria muito boba de não gostar de você só porque você é falante e não tem um cavalo.
– Eu queria levar um presente pra ela tia. Um presente de princesa. A senhora acha melhor levar uma banana ou uma bolacha, que é mais saudável?

A. Masini

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O aprendizado se dá por tentativa, erro e a correção do erro. No meu modo de ver, o erro é uma ferramenta de aprimoramento. Assim, te convido a deixar seu comentário. Abraço, Aldo

Às vezes

Às Vezes


Às vezes,
minhas palavras não são capazes de traduzir com clareza tudo em que penso,
aquilo que sinto
e menos ainda o quê me vai na alma...
Às vezes,
meus pensamentos correm rápidos demais e não consigo acompanhá-los,
meu coração bate rápido demais,
como se desejasse fugir de dentro de mim,
ganhar independência, vida própria.
Às vezes, é minha alma que deseja correr,
partir para longe,
longe desse coração que sente e se ressente,
longe desse corpo que envelhece e se condói,
longe desses tantos pensamentos conflitantes,
longe dessas palavras que se perdem em enganos grosseiros
longe de tudo que macule o amor puro e branco
que minha alma tem pela vida.

A. Masini


Um mundo novo por detrás das palpebras

Um mundo novo por detrás das palpebras


Te enxergo tão bem quando de olhos fechados
que quando os abro,
nos efemeros instantes que ainda dura o lume do seu sorriso,
um mundo novo se descortina diante minha retina.
Nele, tudo é mais vivo
tudo é mais iluminado
tudo é mais colorido.
E minha vida,
a que ainda restou dentro de mim
me diz que esse bocado de existência,
sensivel apenas por suspiros
ou lágrimas fugidias desses mesmos olhos quando ha mais tempo abertos,
pode valer a pena
se o piscar dos meus olhos for mais lento, mais freguente
porque só quando os fecho
consigo observar o que há dentro de mim,
no centro do que sou.
Lá, você ainda permanece a mesma,
que um dia por mim também se apaixonou.

A. Masini


Apartados (antes mesmo de unidos)

Aparados



De onde vem esse seu poder de transformar meus dias? De reunir cada uma das nuvens escuras de chuva e fazê-las dissipar, para em seguida, surgir o sol, iluminando cada canto escuro de minha alma atormentada?

De onde vem esse encanto, que me faz depositar cada uma das minhas esperanças nos sonhos que seus sorrisos me promovem?

De onde vem esse sentimento que me invade os olhos, corre por minhas veias, toma meu corpo e se instala em festa em meu coração a cada oportunidade que tenho de te ver?

Que coro angelical é esse que canta pra mim sempre que te ouço?

Que mulher é você, que parece ter sido feita sob medida para meus abraços, beijos e carinhos?

Que vida afinal é essa, que apesar dessas tantas coisas que me põem na sua direção, ainda assim nos manteve apartados de tudo isso?



A. Masini